Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!
(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)
Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.
Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.
E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?),
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.
Thursday, March 26, 2015
Tuesday, March 24, 2015
Trai lai lai lai
Hoje não foi um dia feliz... não te sentes na plenitude das tuas forças, ligas a televisão e vês um rasto de morte e condóis-te, mesmo que não conheças as pessoas que perderam a vida... lidas diariamente com o asco que as pessoas te provocam, seja por abandonarem e maltratarem animais, seja por trabalharem ao pé e serem do mais mesquinho e nojento que pode haver... enfim, há que respirar e alegrarmo-nos com as boas notícias :)
http://pt.blastingnews.com/lazer/2015/03/a-nut-coimbra-abre-ja-em-abril-00319573.html
http://pt.blastingnews.com/lazer/2015/03/a-nut-coimbra-abre-ja-em-abril-00319573.html
Friday, March 20, 2015
Thursday, March 19, 2015
Subitamente, à beira de um monte, um homem de pelico ergueu a mão ao carro. Eram três ou quatro casas apinhadas num terreiro. Moura parou e reconheceu o homem:
- Você outra vez? Então o que é que há de novo?
- Eu sabia que o senhor doutor ia ali à dona Alzira e pus-me aqui à espera.
- Mas então o que é que há?
E o homem contou uma história incrível. Moura já a conhecia, porque fez referência a uma consulta na cidade. Mas de nada lhe valeu, porque o homem queria contá-la outra vez desde o princípio. Receava decerto que lhe tivesse falhado algum pormenor e que isso lhe destruísse a esperança. Contava-a agora de novo:
- Quando foi da sementeira, o patrão Arnaldo disse-me: «Ó Bailote, tu já não tens a mesma mão para semear.» Porque eu, senhor doutor, tive sempre uma mão funda, assim grande, como um cocho de cortiça. Eu metia a mão ao saco e vinha cheia de semente. Atirava-a à terra e semeava uma jeira num ar.
Conta, bom homem, conta o teu sonho perdido. Tinhas, pois, uma boa mão de semeador bíblico. Atiravas a semente e a vida nascia a teus pés. Eras senhor da criação e, o universo cumpria-se no teu gesto. E, enquanto o homem falava, eu olhava-lhe a face escurecida dos séculos, os olhos doridos da sua divindade morta. Imaginava-o outrora dominando a planície com a sua mão
poderosa. A terra abria-se à sua passagem como à passagem de um deus. A terra conhecia-o seu irmão como à chuva e ao sol, identificado à sua força de biliões.
- Agora o patrão diz que eu já não tenho mão.
E mostrava a sua desgraçada mão, envelhecida, carbonizada de anos e soalheira. Moura olhou-me e sorriu-me numa cumplicidade.
- Olhe. Faça ginástica aos dedos. Assim.
E exemplificava. De olhos escorraçados, o homem lamentou-se:
- Tenho feito, senhor doutor. Mas o patrão Arnaldo diz que eu já não tenho mão. Veja, senhor doutor, então isto não será ainda uma mão de homem?
E tentava cavá-la fundo, com os dedos gretados no ar.
- Então que quer que eu lhe faça?
- Dê-me um remédio, senhor doutor. Um remédio que me ponha a mão como a tinha. Assim grande, assim funda, assim, assim... .
E moldava no ar a capacidade de uma mão de Jeová. Fios de sol escorriam de uma azinheira perto da estrada. Os campos repousavam no grande e plácido Outono. E pelo vasto céu azul, sem a mancha de uma nuvem, ecoava levemente a última memória de Verão. Moura pôs o motor a TRABALHAR.
- Então passe muito bem - disse ao semeador. E o carro arrancou, erguendo o pó do caminho.
Mas a visita à doente foi breve. Era uma casa fidalga perdida no descampado. Espectros de um ou outro homem ou mulher olhavam-me no carro parado, olhavam o silêncio em redor. Regressámos enfim pelo mesmo caminho. Quando, porém, chegámos ao monte do semeador, saltou-nos à frente um grupo de pessoas numa sarilhada de gritos, de imprecações, braços no ar, braços apontados para uma loja. Moura saiu do carro e o magote de gente seguiu-o. Fiquei só. Mas o médico regressava daí a pouco, pálido, transtornado.
- Que aconteceu?
Ele não respondeu logo, conduzindo o carro aos tropeções. E só quando o monte se não via já me declarou:
- O homem enforcou-se.
- Você outra vez? Então o que é que há de novo?
- Eu sabia que o senhor doutor ia ali à dona Alzira e pus-me aqui à espera.
- Mas então o que é que há?
O homem olhou-me para ver até que ponto eu 'podia participar do seu segredo.
- Se é preciso, eu saio - declarei.
- Não, acho que não - disse Moura. - O senhor doutor pode ouvir? - perguntou.
- Ele também é doutor? - adiantou o homem raiado de esperança.
- É doutor, mas não é médico.. Diga lá então.
- Se é preciso, eu saio - declarei.
- Não, acho que não - disse Moura. - O senhor doutor pode ouvir? - perguntou.
- Ele também é doutor? - adiantou o homem raiado de esperança.
- É doutor, mas não é médico.. Diga lá então.
E o homem contou uma história incrível. Moura já a conhecia, porque fez referência a uma consulta na cidade. Mas de nada lhe valeu, porque o homem queria contá-la outra vez desde o princípio. Receava decerto que lhe tivesse falhado algum pormenor e que isso lhe destruísse a esperança. Contava-a agora de novo:
- Quando foi da sementeira, o patrão Arnaldo disse-me: «Ó Bailote, tu já não tens a mesma mão para semear.» Porque eu, senhor doutor, tive sempre uma mão funda, assim grande, como um cocho de cortiça. Eu metia a mão ao saco e vinha cheia de semente. Atirava-a à terra e semeava uma jeira num ar.
Conta, bom homem, conta o teu sonho perdido. Tinhas, pois, uma boa mão de semeador bíblico. Atiravas a semente e a vida nascia a teus pés. Eras senhor da criação e, o universo cumpria-se no teu gesto. E, enquanto o homem falava, eu olhava-lhe a face escurecida dos séculos, os olhos doridos da sua divindade morta. Imaginava-o outrora dominando a planície com a sua mão
poderosa. A terra abria-se à sua passagem como à passagem de um deus. A terra conhecia-o seu irmão como à chuva e ao sol, identificado à sua força de biliões.
- Agora o patrão diz que eu já não tenho mão.
E mostrava a sua desgraçada mão, envelhecida, carbonizada de anos e soalheira. Moura olhou-me e sorriu-me numa cumplicidade.
- Olhe. Faça ginástica aos dedos. Assim.
E exemplificava. De olhos escorraçados, o homem lamentou-se:
- Tenho feito, senhor doutor. Mas o patrão Arnaldo diz que eu já não tenho mão. Veja, senhor doutor, então isto não será ainda uma mão de homem?
E tentava cavá-la fundo, com os dedos gretados no ar.
- Então que quer que eu lhe faça?
- Dê-me um remédio, senhor doutor. Um remédio que me ponha a mão como a tinha. Assim grande, assim funda, assim, assim... .
E moldava no ar a capacidade de uma mão de Jeová. Fios de sol escorriam de uma azinheira perto da estrada. Os campos repousavam no grande e plácido Outono. E pelo vasto céu azul, sem a mancha de uma nuvem, ecoava levemente a última memória de Verão. Moura pôs o motor a TRABALHAR.
- Então passe muito bem - disse ao semeador. E o carro arrancou, erguendo o pó do caminho.
Mas a visita à doente foi breve. Era uma casa fidalga perdida no descampado. Espectros de um ou outro homem ou mulher olhavam-me no carro parado, olhavam o silêncio em redor. Regressámos enfim pelo mesmo caminho. Quando, porém, chegámos ao monte do semeador, saltou-nos à frente um grupo de pessoas numa sarilhada de gritos, de imprecações, braços no ar, braços apontados para uma loja. Moura saiu do carro e o magote de gente seguiu-o. Fiquei só. Mas o médico regressava daí a pouco, pálido, transtornado.
- Que aconteceu?
Ele não respondeu logo, conduzindo o carro aos tropeções. E só quando o monte se não via já me declarou:
- O homem enforcou-se.
Vergílio Ferreira, Aparição
Wednesday, March 18, 2015
Loubado seija o sinhore :p
The War On Drugs - Disappearing
mais um a confundir as contas e o Paredes de Coura está a ficar bruto
mais um a confundir as contas e o Paredes de Coura está a ficar bruto
Tuesday, March 17, 2015
Moonspell - The Last of Us
e eu até nem os curto por aí além... eh pá, adoro a musicalidade do início e do refrão, adoro, adoro, adoro!!!!
Sunday, March 15, 2015
Wild...
confesso que adorei o filme, sem que estivesse à espera de que fosse um filme magistral. Gostei pelo conflito pessoal retratado, pela autodestruição a que se entrega uma mulher, mas acima de tudo pela caminhada... o percurso visto como forma de procura, com forma de encontro e como forma de purificação. E a menina Reese dá-me provas de uma moça bem versátil; quem a viu a fazer um papel de caca em Legally Blonde, não estaria à espera de a ver numa interpretação tão sofrida.
E basicamente o filme alimentou ainda mais a vontade cada vez mais premente de também eu fazer uma caminhada, repetir a caminhada de há 15 anos ou aventurar-me na loucura que me assalta o pensamento há muito anos, uma loucura de 700 e poucos quilómetros que teima em persistir.
Friday, March 13, 2015
500ª posta (foi mais atrás)
A trampa que uma pessoa vai escrevendo, só para se sentir no direito (um bocado duvidoso, vá) de comemorar com esta imagem vunita (caracterização também ela duvidosa, digamos). Mais 500 ou 1000 ou muitas mais postas, assim espero :) long live blog!!!!
Festivais!!!!
Isto a coisa começa a complicar-se... É Blur e dEUS no SBSR, é Tame Impala no Paredes, Disclosure e Alt-J no NOS Alive, os meus adorados Interpol e Patti Smith no Primavera Sound... Não querem juntar-se todos a meio caminho e encontravam-se todos ali para as bandas de um determinado paul? Lá para Julho aquilo até deve estar sequinho e, como ninguém se importa com aquilo mesmo, fazia-se lá uma estrutura em madeira e alugava-se uma roulotte de bifanas e finos. Fazia-se uma festa que era um mimo, eu agradecia imeeeeeeeeeeeeeeeeeenso e o meu bolso também :D
E é sexta-feira 13!
Normalmente até tenho mais medo do sábado 14, que é o dia em que me acontecem todas as desgraças, mas parece que o azar dura 48 horas :)
Wednesday, March 11, 2015
Tove Lo - Habits (Stay High) - Hippie Sabotage Remix
High all the time
To keep you off my mind
Ooh-ooh, ooh-ooh
Sunday, March 08, 2015
Só me meto em merda..
... e concretamente em iMerda, rai's ma partam se não podia estar quieta. Ai que fúria! Odeio tecnologia que se julga superior ao ser humano! Mas vocês, iTraquitanas do piço, não me vão levar a melhor! Fica a Promessa!
Thursday, March 05, 2015
Às vezes...
... não dizemos às pessoas o quanto gostamos delas... elas podem saber, mas têm carência de o ouvir... às vezes, magoamos as pessoas de quem gostamos, por muito que não seja a nossa vontade... deixamos que essa amargura se instale dentro de nós, sem que nada façamos para a combater... e deixamos o tempo passar, e deixamos esse sentimento ficar... e a vida é curta, muitas vezes penosa e injusta... às vezes, é preciso que a desordem surja para descermos à terra e pararmos para pensar e, acima, de tudo, agir, viver...
... nesta semana, já disse muitas vezes 'gosto muito de ti', já beijei e já abracei, no mais puro arrebatamento que o meu coração pode permitir... sinto-me incompleta, ainda assim...
Sunday, March 01, 2015
A CASA DO TEMPO PERDIDO
Bati no portão do tempo perdido, ninguém atendeu.
Bati segunda vez e mais outra e mais outra.
Resposta nenhuma.
A casa do tempo perdido está coberta de hera
pela metade; a outra metade são cinzas.
Casa onde não mora ninguém, e eu batendo e chamando
pela dor de chamar e não ser escutado.
Simplesmente bater. O eco devolve
minha ânsia de entreabrir esses paços gelados.
A noite e o dia se confundem no esperar,
no bater e bater.
Bati segunda vez e mais outra e mais outra.
Resposta nenhuma.
A casa do tempo perdido está coberta de hera
pela metade; a outra metade são cinzas.
Casa onde não mora ninguém, e eu batendo e chamando
pela dor de chamar e não ser escutado.
Simplesmente bater. O eco devolve
minha ânsia de entreabrir esses paços gelados.
A noite e o dia se confundem no esperar,
no bater e bater.
O tempo perdido certamente não existe.
É o casarão vazio e condenado.
É o casarão vazio e condenado.
Por Carlos Drummond de Andrade
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